Miolando

28 fevereiro, 2009

o baú



















Dizia o meu avô uma vez "Óh maria felismina, ainda não acabaste? Ve lá se acaba o caderno antes da história". Tinha eu 6 ou 7 anos, algures nas férias do carnaval ou da páscoa, o trabalho de casa era fazer uma história... eu percebi, uma história. Meti castelos velhos e abandonados, um grupo de jovens e um cão, meti sustos e corridas e suspense e um final feliz. Perdi a conta das páginas que escrevi, com aquela letra da primária que já nem me lembro como era. Perdi o rasto do caderno também, infelizmente. Claro que ninguém acreditou que aquilo tinha sido escrito por mim, na altura não me importei. Hoje até digo que foi um elogio dos valentes. Pensando agora, até dá vontade de procurar a professora, e perguntar se sempre tive um 0 com aquele trabalho... fosse eu um filme e fazia isso. Descobrir histórias de mim que o tempo cobriu, será que ela se lembraria? Lembrei-me agora, nunca aprendi a fazer contas de dividir com mais de dois dígitos, nunca percebi a lógica de quantos 4 cabiam num 7, e o resto para onde iria, e as escadinhas de números, como apareciam...

Isto tudo porque encontrei uma foto de criança, tirada no quintal da casa do meu avô. Faleceu no principio de janeiro, com uns belos 86 anos, ainda numa 4a feira andava na rua, mas o frio abraçou-o de tal forma que no sábado seguinte tomou outro caminho. As chaves dessa casa foram entregues ao senhorio há poucos dias, eu nunca consegui entrar por uma última vez na casa, no quintal. E eu até queria ficar com uma das plainas dele, do barraco das ferramentas. Perdi o rasto a mais um caderno.

Ficam as memórias só, tenho que guarda-las...

20 fevereiro, 2009

frag-men-tada




















até gosto desse teu cabelo, indigo, como te disse... ou sou eu que o vejo assim? não interessa agora também. Assim é que és bonita, como eu te vejo. "do you think i'm yours?" Como é que ele pode falar assim joana? caralho, ele há-de morrer, e não conseguir esquecer o que fez. Eu quero-o ver no chão, a chorar, a implorar paz...

Acorda joana. Tens que te deixar dessas coisas. Levanta-te, que é dia de trabalho. Esperam-te as letras, o café da máquina, as pausas do cigarro, deixa esses pensamentos como o fumo que se esfuma da beata. Espera-te o dia, o brilho dos olhos, dos teus acima dos outros. São os teus que têm que brilhar mais, muito mais que os outros. E a merda do dia, do stress do trabalho, da paranóia do patrão, é isso que te espera joana. E tu vais, com sorriso nas bentas, nariz empoleirado de fronha ao ar. É teu o dia joana. Joana...


foi assim que ele te deixou, fragmentada, crua. E quando é que volta? Havias de pintar as paredes de verde maça. É a cor oposta do vermelho sabias? Havias de te vingar, eu ajudo-te, já tenho um plano joana. Um plano vermelho, encarnado, bem quente e doce Joana. PÁRAAAA!!! Quem és tu joana? Como é que acabaste a falar contigo própria? Vai ver um médico joana, isto não pode ser normal. Não existe cabelo indigo, não existe joana, é tudo raíz da tua loucura joana. Vai, já. A parede já é verde... de caminho é tarde, que ele volta.

sinto falta daquele sol...

16 fevereiro, 2009


encostei a face às teclas

murmurei-lhes a melodia
.
beijei as notas

e calei o canto

e engoli a vida

.
.
.
.
.
.
.
imóvel silêncio

dos dedos que esperam

calor sulfúrico

do suor que corre

e nos dedos incertos

liberto o canto

que escala

tropeça

e se estende

pelo tempo

.

.

.

.

.

para além da nota

.

.

.

.

para lá dos dias