Miolando

08 setembro, 2006

noitescuromuitoscuro.


há dias a corrida era em que direcção.

o asfalto negro, o céu escuro, a sombra preta.

há dias era uma noite enorme envolvendo o corpo como o ar cego como debaixo de cobertores assustados ou um casaco apertado.

ou um abraço de quem temos medo.

há noites era madrugada e o caminho perdido sem luz de lua a orientar sem piscar de estrelas a inventar, o peito a respirar tudo a respirar tudo a respirar tudo em asfixia o coração em asfixia a bater toda a força os pés desamparados no chão a correr assustado como a merda pelas pernas abaixo em asfixia e o eco, apenas o eco dos ruídos estranhos à margem da estrada, lobos à margem das sombras, barulhos assustadores de cães assassinos escondidos no bosque à margem do crude buraco do piche fundo, os teus esgares e os teus gritos toca-me mata-me fura-me

[casa do regado.porto.8 de agosto de 2006]


Só para dizer...

  • Numa noitescura vi a tua imagem e pareceu-me um filamento luminoso do qual saltava uma pipoca. Devia estar mesmo escuro ;)

    Também eu andei em corridas no escuro numa cidade de loucos e doidos que nos invadem de medo e aterram a alma. São os lobos que estão à margem da sombra e que saltam para o asfalto, perseguindo as suas presas e abraçando-as com os braços todos gelados do medo.
    Tocam-te matam-te furam-te e deixam-te numa imperceptível e invisível nudez...

    teclado por Blogger patricia, em 10 setembro, 2006  

  • algo mudou ou se mudou
    o quê
    tão-infinitamente-para-além-das-casas-e-das-luas!?

    teclado por Blogger ~pi, em 10 setembro, 2006  

  • apanho agora a camioneta para trabalhar longe. há meses pude optar pelo contrário. apesar do cansaço e das dificuldades em readaptar com urgência confesso uma estranha felicidade, uma estranha leveza. será este o meu futuro, com asas de arribação? em tempos tive horários, uma casa que habitei com uma mulher que à noite se deitava a meu lado. há anos pude optar por tudo manter.

    teclado por Blogger Paulo Alexandre Jorge, em 12 setembro, 2006  

  • Ando a ler um livro de João Aguiar e quando li esta frase parei a narrativa e meditei. Hoje, depois de ler este teu comentário, partilho-a contigo.

    "- O nosso lugar é sempre onde nós estamos, por muito que nos custe. Às vezes, custa muito."

    Bjs**

    teclado por Blogger patricia, em 12 setembro, 2006  

  • olá patrícia. por isso vou aceitando estas penas em asas que me crescem, o tremer do corpo quando a primavera e o outono se aproximam, o meu nariz se levantar como focinho procurador ao surgir do galgo vento de leste. "às vezes, custa muito". nada a fazer. será assim até ao cansaço, até ao final do poema. há ainda a questão de me parecer o homem um bicho de arribação solitário; não voa em bandos. beijo.

    teclado por Blogger Paulo Alexandre Jorge, em 12 setembro, 2006  

  • adorei a referência da pipoca, tb foi isso que vi

    teclado por Blogger superpiloto, em 12 setembro, 2006  

  • Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

    teclado por Blogger superpiloto, em 12 setembro, 2006  

  • ecos, elos expostos de janelas ausentes, ausências, baba, Paulo, estou, estamos por aqui. não tão longe. feridos, asas furadas, entretanto vivos, diz

    teclado por Blogger ~pi, em 12 setembro, 2006  

  • toca-me, mata-me, fura-me, dizes...
    o jogo é fatal e,contudo, deve jogar-se. que belo texto, Paulo. Temos saudades tuas. Abraço,

    dália

    teclado por Blogger Dália Dias, em 15 setembro, 2006  

  • e eu vossas, dália, saudades tantas (cá vos aguardo, nas margens do alva, lembrem!)

    teclado por Blogger Paulo Alexandre Jorge, em 15 setembro, 2006  

  • Vortex.

    Uma sugestão para o possível título de um poema ou livro.

    CSD

    teclado por Blogger Claudia Sousa Dias, em 19 setembro, 2006  

Enviar um comentário

<< Voltar ao blog