15ª diária
"quem regressa tardio como eu; lhe faltam palavras; gasta vontade não levanta braços não emite sons, não os enrola na língua de sensos; a paz deve conter sempre algum cansaço; é fácil lembrar o corpo dela; de como transpirava; já tenho idade para perceber que me escondo na boca do saxofone; e que é dele que surjo como bicho da cova: e que a ele torno; e que dele saio; alguma da ciência é o tempo quando: o bicho procura comida quando a fome, esconde-se ameaçado; lembrar o corpo dela; de como tremia; passar o tempo todo em concerto que não termine - não termine o seu respirar ofegante, não acabe a língua longa com que me molhava, não mo faça esperar: quem regressa tardio como eu - já tenho idade para perceber que morro e como ser eterno: apertar ligeiramente os lábios, um ataque de leve sopro em torno da boquilha e; o sopro de que se vive ser o sopro que esvazia; o som que amplia ser a melodia que ensurdece; confuso; cansado. cansado."
eugénio alves da cruz, lisboa, 8 de novembro de 1997
Só para dizer...
quem és tu? e sei que te conheço!bela prosa, belo...
abraço mesmo
teclado por A do Costume, em 10 dezembro, 2007
o saxofone é o colo da memória, o útero do som da dor...
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teclado por patricia, em 11 dezembro, 2007
Este comentário foi removido pelo autor.
teclado por ~pi, em 11 dezembro, 2007
de todos os concertos o último é sempre o melhor quando
já arrefecidos os dedos recolhem à sua provisória e ancestral vocação
vocação utilitária
rasteira
de isolar-se no pó
estalagmites estendidas espetadas
nos olhos na boca no ventre
e os dedos de novo e por fim
fragilmente estremecidos
cordialmente esquecidos
regressados de todas as viagens
recolhendo na boca o sopro mais azul da melodia
~
teclado por un dress, em 11 dezembro, 2007
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